Existe gordofobia no ensino de canto?

A relação entre corpo e voz é frequentemente analisada na pedagogia vocal, mas raramente se discute como a gordofobia impacta o ensino e a performance no canto. A gordofobia no ensino de canto se manifesta de maneira estrutural e sutil, afetando a percepção da técnica vocal, as oportunidades para cantores gordos e até mesmo o repertório de ensino.

Muitas vezes, alunos gordos enfrentam discriminação velada, desde a falta de representatividade no material didático até comentários sobre sua capacidade respiratória ou presença cênica. Essa visão limitante não apenas afasta talentos do canto, como também reforça padrões excludentes na indústria musical. Neste artigo, vamos explorar os impactos da gordofobia no ensino do canto e como podemos tornar esse ambiente mais inclusivo.


O Corpo como Ferramenta Vocal e os Mitos sobre Peso e Canto

Um dos maiores mitos perpetuados na pedagogia vocal é a ideia de que a gordura interfere na respiração e na qualidade da voz. Muitos professores e até profissionais da música associam corpos magros a maior mobilidade e melhor técnica vocal, ignorando completamente os fundamentos fisiológicos do canto.

“Pessoas gordas respiram pior e têm menos fôlego para cantar.”

mito 1

A respiração no canto não depende da aparência física, mas sim da coordenação do diafragma, das costelas e dos músculos intercostais. Estudos como “The Respiratory System and Singing” (Oxford Handbook of Singing) mostram que a capacidade respiratória pode ser desenvolvida independentemente do peso corporal. Além disso, a resistência vocal é muito mais influenciada pela técnica e pelo condicionamento muscular do que pela estrutura corporal.

“Corpos magros têm mais mobilidade para a performance.”

mito 2

A performance vocal não está ligada a um padrão corporal específico. A ideia de que cantores precisam ser magros para se movimentar melhor no palco desconsidera artistas como Lizzo, Beth Ditto e Pavarotti, que possuem presença cênica marcante e grande domínio corporal. O verdadeiro diferencial de uma performance eficaz está na expressividade e no controle técnico do cantor, não em seu tipo físico.

Esses mitos reforçam a gordofobia no ensino de canto, criando barreiras desnecessárias para cantores gordos que, muitas vezes, precisam provar repetidamente sua capacidade técnica e artística.


A Gordofobia Estrutural no Ensino de Canto

A pedagogia do canto historicamente impõe padrões de corpo que limitam a diversidade de vozes e a inclusão de artistas fora dos moldes estéticos idealizados. A gordofobia estrutural afeta tanto a didática quanto a forma como os alunos são incentivados ou desencorajados a seguir carreiras na música.

Algumas das formas mais comuns dessa discriminação incluem:

mulher resistindo à gordofobia

Falta de representatividade nos currículos de canto: A maioria dos materiais didáticos ainda usa referências de cantores magros como padrão de técnica vocal, desconsiderando a diversidade de corpos e timbres presentes na música erudita e popular.

Resistência da indústria a corpos gordos em determinados gêneros musicais: Enquanto no blues, no gospel e no soul artistas gordos foram historicamente aceitos (como Aretha Franklin e Ella Fitzgerald), em gêneros como pop e música erudita, cantores gordos enfrentam mais barreiras, sendo muitas vezes aconselhados a perder peso para serem levados a sério.

Pressão estética em audições e produções musicais: No canto lírico, por exemplo, há um padrão corporal idealizado onde cantores magros são vistos como mais expressivos e adequados para os palcos. Um estudo do International Journal of Music sobre a relação entre o corpo dos cantores de ópera e a percepção do público mostra que a aparência ainda influencia diretamente a contratação de artistas.

A gordofobia não apenas limita oportunidades, mas também influencia como os alunos gordos se percebem dentro do aprendizado do canto. Muitos internalizam a ideia de que nunca serão vistos como “bons o suficiente” por conta de seu corpo, o que pode levar ao abandono da prática vocal.


Consequências da Gordofobia na Saúde Vocal e Mental

A pressão estética no ensino do canto não afeta apenas a autoconfiança dos alunos, mas também pode prejudicar sua saúde vocal e mental.

Desenvolvimento de tensão corporal: A vergonha do próprio corpo pode levar a uma postura rígida, resultando em maior tensão na laringe e comprometendo a ressonância e a projeção vocal. Cantores que sentem a necessidade de se “esconder” no palco acabam limitando seu potencial artístico.

Desmotivação e desistência do canto: Muitos alunos gordos relatam que, ao longo da formação, sentiram-se desvalorizados e sem espaço para crescer artisticamente, levando-os a abandonar o canto. Essa desistência não ocorre por falta de talento ou técnica, mas sim pelo impacto psicológico da exclusão.

Distúrbios alimentares e saúde vocal comprometida: A pressão para emagrecer pode levar cantores a adotarem dietas restritivas que comprometem sua energia, resistência e hidratação vocal. A falta de nutrição adequada pode afetar a lubrificação das pregas vocais, prejudicando a qualidade do som e a recuperação vocal após ensaios intensos.


Como Transformar o Ensino de Canto para Ser Mais Inclusivo?

O ensino de canto precisa evoluir para ser um espaço mais acessível, inclusivo e respeitoso para todos os corpos. Algumas mudanças fundamentais incluem:

Desconstruir mitos sobre peso e voz: Professores devem buscar atualização e eliminar crenças ultrapassadas sobre a relação entre corpo e técnica vocal.

Valorizar a diversidade de corpos e timbres: Currículos de canto devem incluir referências a cantores de diferentes corpos, gêneros e etnias, ampliando o repertório de exemplos positivos.

Criar espaços seguros para o aprendizado: O ensino de canto deve ser um ambiente livre de discriminação, onde todos os corpos sejam respeitados e incentivados a explorar suas potencialidades vocais sem julgamentos.

Reforçar a técnica vocal sem viés estético: O foco deve estar na qualidade da emissão vocal, respiração e ressonância, não no peso do cantor.


Conclusão

Cuidar da sua voz vai além da técnica, envolve acolhimento, conhecimento e um ambiente seguro para desenvolver seu potencial sem julgamentos. Se você quer aprender a cantar com segurança, respeitando o seu corpo e explorando ao máximo suas capacidades vocais, venha conhecer nossas aulas de canto! Oferecemos um ensino acessível, totalmente on-line, para atender alunos em qualquer lugar do Brasil e do mundo. Nossos planos se adaptam à sua rotina e orçamento, com valores a partir de R$280,00 por mês, disponíveis em frequências semanais, quinzenais e até três vezes ao mês. Quer evoluir no canto com acompanhamento profissional? Clique aqui e saiba mais!


Fontes:

  • “The Respiratory System and Singing”, Oxford Handbook of Singing.
  • “The Opera Singer’s Body and the Audience’s Perception”, International Journal of Music.
  • “O corpo na performance musical: desafios para a pedagogia vocal”, Repositório CAPES.